Comentário
à Cantiga de Amor
Proençaes
soen mui bem trobar
Proençaes
soen mui ben trobar
e dizen
eles que é con amor;
mais os
que troban no tempo da frol
e non en
outro, sei eu ben que non
an tan
gran coita no seu coraçon
qual m'eu
por mha senhor vejo levar.
Pero que
troban e saben loar
sas
senhores o mais e o melhor
que eles
poden, soõ sabedor
que os que
troban quand'a frol sazon
á, e non
ante, se Deus mi perdon,
non an tal
coita qual eu ei sen par.
Ca os que
troban e que s'alegrar
van eno
tempo que ten a color
a frol
consigu', e, tanto que se for
aquel
tempo, logu'en trobar razon
non an,
non viven [en] qual perdiçon
oj'eu
vivo, que pois m'á-de matar.
El-Rei D.
Dinis, CV 127, CBN 489
Itens para análise:
. a
relação entre o amor e o «tempo da frol»;
. a
oposição «proençaes»/»Eu»;
. o tema
da cantiga;
. o aspecto
formal.
As cantigas de amor fazem parte da
lírica trovadoresca. Nestas, o trovador expressa o sentimento e sofrimento
amoroso pela dama cortejada, falando em seu próprio nome e prestando-lhe uma
“vassalagem amorosa”, obedecendo ao código do “amor cortês”. A “senhor” é
sempre louvada e caracterizada como um ser perfeito.
Na cantiga proposta para análise, o
trovador critica o artificialismo do amor cortês em oposição à autenticidade do
amor que ele sente. O trovador fundamenta esta questão pelo facto dos
«proençais» apenas trovarem «no tempo da frol/e non en outro», o que prova a
falta de sinceridade do seu sentimento, já que este só existe na primavera.
Desta
forma o trovador considera-se diferente dos «proençais», pois o seu amor é
sincero e o seu sofrimento verdadeiro, afirmando perentoriamente, através do
presente do indicativo, que os «proençaes» não têm «tan gran coita no seu
coraçon/qual m’eu por mha senhor vejo levar». Os «proençaes» não vivem o
desespero em que ele vive «non viven en
qual perdiçon/oj’eu vivo», pois eles só trovam no «tempo da frol»,
«tanto que se for/aquel tempo, logu’en trobar razon/non an», o que confirma o
artificialismo dos seus sentimentos. Há que salientar a ironia que o trovador
utiliza na forma verbal «dizen», manifestando, assim, o seu cepticismo
relativamente aos «proençaes» que não amam como ele, amor esse que «m’á-de
matar».
Relativamente
à sua estrutura formal, é uma cantiga de
mestria constituída por três estrofes de seis versos (sextilhas)
predominantemente decassílabos. Quanto à rima, esta apresenta-se emparelhada em
«amor» e «frol», e interpolada em «trobar» e «levar», de acordo com o seguinte
esquema rimático: abbcca, que se repete ao longo das três estrofes. Em relação
à morfologia, a rima é predominantemente pobre, como em «trobar» e «levar». No
que respeita à acentuação é exclusivamente aguda «frol», e no que concerne à
fonia é predominantemente consoante «loar», «par».
«Proençes soen mui ben trobar» é assim uma cantiga
de amor que, ao contrário das outras, faz uma crítica ao «amor cortês» pela sua
artificialidade, contrapondo-a à sinceridade do trovador que compõe a cantiga
que sente um amor verdadeiro.
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